sexta-feira, 20 de junho de 2008

O dilema do mexilhão


“Quando o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão.” Mas quem o manda viver nas rochas? Que dizer de um bicho cujos principais predadores são a estrela-do-mar e o homem – um animal sem cérebro e outro que tem dificuldade em usá-lo?
O mexilhão é um molusco bivalve que vive no dilema das rochas: umas vezes tem água para filtrar e alimentar-se, outras nem por isso. Tal como o meu dilema em comprá-lo para o cozinhar. É que um quilo de mexilhões custa apenas cerca de dois euros. Em termos absolutos é o molusco mais barato do mercado. E se lhe chamarem marisco, é o “marisco” mais barato do mercado a seguir aos tremoços. Mas por outro lado, são conchas muito grandes para bichos muitas vezes muito pequenos. É verdade que são deliciosos e sabem a mar. Mas por outro lado, dão um trabalhão enorme a preparar.
Quando faço compras e sei que tenho tempo para os lavar compro um quilo para fazer de entrada ou de petisco. A lavagem é morosa e aconselha-se uma escova forte, uma faca e água corrente (não é aconselhável ficarem mergulhados em água porque perdem sabor). O mexilhão não é muito inteligente, mas é um “coração grande” pronto a deixar que outros bichos habitem nas suas conchas. É preciso limpar e lavar um a um, tirando a maioria dos bichos mais a lama, os limos e as suas famosas barbas que gosta de manter de molho. Não aconselho a arrancá-las por esticão, porque alguns deles estão demasiado “apegados” a elas (eu compreendo perfeitamente apesar de ter pouca) e podem muito bem sair disparados atrás delas partindo a casca. Ou as tiro com jeitinho ou opto por cortá-las com uma tesoura.
Depois de lavados, o caso muda de figura. São uma excelente ajuda para um jantar mais cuidado e um brilharete como entrada.
Gosto deles numa generosa cebolada com molho de tomate. Antes de começar a preparar o resto do jantar ponho a panela ao lume. Começo pelo refogado: azeite, cebola, alho e sal. Junto pimentos vermelhos e quando estiver tudo murcho, junto polpa de tomate, vinho branco e picante. Mais tarde acrescento as ervas que tiver, de preferência, frescas.
Enquanto a molhanga apura vou fazer o resto do jantar. De vez em quando dou uma olhadela, mexo com cobiça e continuo a fazer o jantar. Cinco minutos antes de servir, passo os mexilhões pela panela – o objectivo é só que abram e antes que dêem o último grito, tiro tudo e sirvo numa travessa.
O último dilema: dedicamo-nos a comer os bichos ou a molhar o pão? Seja como for, se sobrar molho pode guardar-se para comer frio com pão ou com tiras de milho. Dá trabalho, mas compensa. E quem se lixa é sempre o mexilhão.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Perna de perúa winehouse


Jantei tarde. Fui ao congelador e encontrei uma boa perna de perúa. Meti-a no microondas a descongelar e na televisão meti o concerto do Rock in Rio da Amy Winehouse. Confesso que eu próprio só ia ao RiR se estivesse bêbado e sem voz de tanto gritar no, no, no.
Para um recipiente cortei um caldo de galinha, três dentes de alho picados, uma folha de louro, pimentão doce, sal, pimenta, ervas de provence e três pés de poejo. Reguei com sumo de limão e esmaguei tudo.
Apesar de até gostar dela, retralhei as pernas todas à perúa. Talvez arrependido, untei-lhe todos os golpes com o cocktail que tinha preparado. Polvilhei com mais ervas de provence, coloquei-lhe gentilmente a perna num papelote e levei ao forno. Pús-me a ver o concerto e a rir. O concerto acabou e, ainda a rir, fui ao forno abrir o papelote. A perna da perúa já estava pálida e por isso ofereci-lhe algum ananáz cortado em pedaços grandes e rebentos de bambú. Deixei tudo no forno.
De vez em quando ia ver como estava a coisa e regava-a com as próprias lágrimas.
Finalmente tirei do forno, com cuidado para não cair, mas sem evitar este resultado estranho.
Depois servi-me. Com vinho da casa, claro.
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